Casa de Espíritos

sexta-feira, setembro 29, 2006

Depressão de quase-quase-quase-início-de-quase-meia idade

Ainda tinha deixado algumas coisas em casa dos meus pais. E ontem tive de ir arrumá-las. As minhas recordações de 26 anos ficaram resumidas a três caixas. Os registos da minha passagem pela faculdade foram todos parar ao lixo (inclusivé centenas de páginas de fotocópias de livros e mais livros. Escapou 'a utopia', do thomas moore, sei lá porquê...). Fiquei apenas com as coisas verdadeiramente inúteis que já guardava há muitos anos. Exemplo: bilhetes de cinema - dezenas deles (quem é que ia ver 'O Piano' às 13h45 de um dia de semana no King? 350 escudos????); cartões de escola, passes, cartões de jornalista; fotografias foleiras de namorados que escreviam dedicatórias tolas nas costas ('para a pessoa mais querida do mundo, porque se não fosse assim eu não me teria apaixonado perdidamente por ela, como é o caso' - hahahahahah!); guardanapos com poemas escritos em inglês sabe-se lá por quem; desenhos abstractos de colegas do 9º ano que hoje são resposnsáveis financeiros de grandes empresas; cartas - muitas cartas - de pessoas que eu já nem me lembro quem eram (tive de explicar à minha mãe que nessa altura não havia email nem messenger (ela tb não sabe o q isso é...) nem telemóvel nem sms. as coisas eram mesmo ditas e escritas à mão); colecções de folhas de blocos com cheirinho; diários e agendas desde os meus 8 anos ('este fim-de-semana vou vestir a minha roupa nova. de certeza que o h. vai reparar em mim'); dossiers de escola personalizados (vivam os recortes do 'blitz'!); bilhetes de avião (quantas vezes fui eu a Londres?) e muitos bilhetes de concertos. Lloyd Cole em 1994. Jorge Palma em não sei quantos (só deixei de gritar nos concertos dele aqui há uns cinco anos). Festivais de bandas punk e rockabilly algures num clube recreativo em 1990. Caetano em 1997. Pearl Jam em 1993 (ou 4) em Cascais. Fiquei cheia de pó. E de melancolia idiota.

segunda-feira, setembro 25, 2006

Live fast; Die young


O tio H. sempre teve piriquitos. Piriquitos, canários, muitos passarinhos. O R. foi a casa do tio e saiu de lá com uma certeza: também queria comprar um piriquito. O tio explicou-lhe tudo: tens de comprar uma gaiola, uma casinha, um recipiente para a água e outro para a comida; tens de limpar a gaiola; eles comem duas coisas: ração e uma pequena dose de vitaminas. O R. foi a correr comprar tudo. Em casa da tia L. os passarinhos pareciam loucos. Cantavam noite e dia, não paravam de voar. Até parecia que falavam. Estavam mesmo contentes, pensou o R. Mas no quarto dia, apareceram mortos. Com as patinhas para o ar e um ar de descanso eterno. Será isto normal?, perguntou-se o R. Até que o tio H. descobriu o erro: durante 4 dias os piriquitos não comeram outra coisa que vitaminas. O R. esqueceu-se de comprar a ração.

Na sexta-feira, passados quase 30 anos sobre o episódio, chegámos a uma conclusão: este havia sido mais uma história em que os heróis tinham 'live fast' e 'die young'.

quarta-feira, setembro 20, 2006

Copy+paste*

"Portugal é uma fatia vertical de paisagens horizontais", dizia o Sérgio Godinho, outro dia, num programa de televisão.
*com a devida autorização, de www.cadernodecorda.blogspot.com

sexta-feira, setembro 01, 2006

Histórias da Festa


Sábado, 5 ou 6 da tarde, Palco 1º de Maio (quando ainda era uma espécie de tenda de circo onde os lugares sentados eram... no chão). Em mais uma tarde dedicada ao jazz nacional, Mário Laginha entra tímido no palco de meio metro de altura. Começa a tocar e empolga-se. Levanta-se do banco e continua a tocar, quase que transpira de emoção. Lá à frente, há alguém que se levanta ainda dentro do saco-cama e pede: 'Ó Mário, toca mais baixinho, que o pessoal quer dormir...'.

Algures nos anos 80. Num dos palcos secundários, um grupo toca uma música de Zeca Afonso. Muita gente a dançar. Um punk cheio de piercings, alfinetes de dama, roupa preta de cabedal e cabelo em crista pintado às cores dança com uma senhora alentejana, de cabelos brancos, que podia ser a minha avó. Estão todos sorridentes. No final da música, o punk pega no colo a velhota e dá-lhe um beijo. A senhora é só risinhos. 'Ai magano!'

Sexta à noite, 2003. O pior grupo de sempre de música brasileira toca forró no palco Lisboa. Desafinam como nunca vi. São dois vocalistas, e nunca acertam para cantar ao mesmo tempo. Enquanto um diz para as pessoas cantarem, o outro pede silêncio. O músico que está no órgao desafina e esquece-se da nota que vinha a seguir. O público delira. Toda a gente - toda - dança como se não houvesse amanhã. Houve quatro encores.

ps: A Festa é sempre a Festa. Vou lá desde que tinha 3 semanas de idade. Gosto da Festa, porque não há (mesmo) Festa como esta. Vou agora para lá. Assim que entrar no autocarro, começo a tratar toda a gente por 'Camarada'.